terça-feira, 4 de outubro de 2011

Vocês não são responsáveis pela minha solidão

No dia em que a gata Alice morreu atropelada, a família estava na praia e tudo parecia bem.
Diz que as pílulas que ela andava a tomar lhe estavam a provocar alterações de comportamento, fazendo com que ela fugisse como uma desvairada para a estrada onde teve lugar o trágico acidente.
Para evitar que os cães cheirassem o seu cadáver, e se desse o caso desagradável de desenterrarem a gatinha, a minha tia colocou uma pedra de mármore e uns troncos por cima do sítio onde cavou um buraco para pôr a pobrezinha.

Quando cheguei ao trabalho, a muitos quilometros do mato onde jaz a gata Alice, o meu cão de guarda interior rosnava a quem me ousava falar.
Como um daqueles bêbados das festas que gostam mesmo é de porrada, eu ia tentando armar confusão, a ver se surgia uma oportunidade para eu poder soltar o meu guardião.
Dei por mim literalmente a ladrar, deixando alguns colegas de trabalho extasiados com o meu talento para rottweiler.

Começaram a ficar preocupados quando perceberam que o meu cão de guarda não me abandonava nunca e senti uma certa atrapalhação da parte deles, e novamente os risos nervoso que costumam aparecer quando explico que não quero fazer nada que implique ter vontade de viver.

Na verdade, da mesma forma que, na maior parte do tempo, eu fico nervosa e sem saber como me colocar no mundo, as pessoas parecem não saber como se comportar comigo.
Talvez seja com medo que eu solte o meu anjo canino.

De facto, em muitas das horas do meu dia, eu detesto toda a gente, especialmente as pessoas que parecem que sabem o que estão a fazer, que são tão felizes que nem notam, que se descaem a dizer-me coisas que se passam nas suas vidas que provam que está tudo ok com elas, enquanto me tentavam enganar com os seus problemas.

Na noite anterior à violenta morte da gata Alice, eu subia umas escadas rolantes a olhar para cima e tentava perceber como é que eu tinha chegado até aquele momento de completo isolamento.
Todos me dizem que fui eu (e enumeram coisas que faço erradas) que me coloquei nesta ilha.

Nesta ilha com o meu cão.
Ão. Ão.