quarta-feira, 31 de dezembro de 2008
O tempo vai parar dois segundos e eu vou aproveitar para respirar fundo
E uma mulher sofre sempre quando ele tem outra.)
No balcão estava uma caixa cheia de cuecas azuis.
O senhor perguntou-me se eu não queria umas.
Claro que menti e disse que já tinha.
Eu até gosto de fogo de artificio.
E de festas.
Mas a passagem de ano...
(suspiro)
... tem qualquer coisa de intrinsecamente deprimente e sujo.
Eu gosto das resoluções para o ano novo, gosto da ideia de ir haver um ano novo, podia agora aqui fazer um post sobre 2008 e sobre como foi um ano importante e bla bla bla o proximo vai ser mesmo bom bla bla bla vou-me apaixonar pela pessoa certa bla bla bla vou fazer depilação com regularidade bla bla bla vou partir de terra em terra a fazer o bem.
É verdade que a passagem do ano, o fim de um e o início de outro, são excelentes tópicos de conversa, direi até uns dos melhores desbloqueadores de conversa sazonais.
Mas no fundo no fundo, o belíssimo e romântico cais das colunas é barulhento e malcheiroso e a delicada e pura neve branca é gelada e torna-se numa pasta nojenta de lama preta.
Gosto mesmo é de folhear agendas perpétuas.
Vou comprar uma bonita para mim.
sábado, 27 de dezembro de 2008
O pior é que, quando uma pessoa acorda com frio, custa muito a aquecer
Falar com o pai sempre a discutir também.
Vésperas de Natal e dei graças a Deus por haver azafama.
A minha mãe proibiu-me de ir ao cemitério.
Eu queria ir porque deixei poucas camélias e tudo muito mal arranjado.
Fui lá há dias e nada há de mais triste que um cemitério em vésperas de Natal, cheio de mães que perderam filhos, colocando presentes em campas, eu saí de lá e pensei que é injusto eu não viver quando o posso.
O meu tio veste-se sempre de Pai Natal à meia noite, precisamente quando a familia conversava acerca da psoriase, doença partilhada que tem causado muitos estragos.
Quanto a mim, tinha os pés gelados mas gosto sempre daquele momento em que o meu tio bate com força à porta e assusta os meus primos mais novos, pondo-os a chorar quando lhes diz que, como não puseram sapatinho na chaminé, não terão direito a presentes.
Eu também já passei por isso, sei bem como o Tio Natal é malvado e assustador...
- Traz-lhe já a bola do Benfica para ele não chorar, disse a minha mãe.
Assim fiz.
Fomos poucos para casa, cabíamos num carro só.
Tenho muitas saudades da minha avó.
Ela agarrava-me as mãos para eu não fazer feridas em redor unhas, como tenho o vício de fazer.
Aproximei-me da minha amiga orfã no final da missa de dia de Natal.
Ela disse-me que decidiu não chorar mais, nunca a tinha visto assim, tão determinada.
Fixe, disse-lhe eu.
Abracei-a e comecei eu a chorar.
Claro que o INEM esteve na minha casa no dia de Natal à tarde, devido a um chilique da sogra da minha irmã.
Mas foi um dia muito bom.
Escreveu-me um amigo meu que 2009 vai ser o melhor ano das nossas vidas.
Por mim pode ser.
terça-feira, 23 de dezembro de 2008
Campeã de Inverno
Tão bonito.
Pensei: detesto esta gente quase toda. Na sua maioria, são pessoas pelas quais não sinto nem estima nem respeito nem qualquer tipo de admiração ou mesmo interesse.
Detesto esta "classe alta", esta "elite" de merda que manda calar a plebe para falar em nome da plebe.
E dei por mim comovida com o Natal.
Tão bonito, o Natal.
A surpresa da salvação a 5 km de Jerusalém.
E eu que só queria estar feliz mas nem sempre dá.
E 2009, que segundo me disseram, vai ser o melhor ano das nossas vidas vai ter um março, um abril, um junho, com dias de sol.
Na verdade, eu acordei cheia de frio e ainda não aqueci.
Parece-me que ninguém quer ser o meu saco de água quente.
quarta-feira, 17 de dezembro de 2008
Ainda vou arrumar toda esta roupa e lavar a loiça
Eu estava com dores menstruais e uma hipoglicemia.
Pior, eu não tinha caso algum para lhe contar.
Com a ajuda do pouco açucar que ainda me chegava ao cérebro, eu ainda dei por mim a tentar lembrar-me de alguma coisa interessante para contar, de preferência da minha vida amorosa pois é sempre um tema espirituoso e engraçado, mas não me ocorreu absolutamente nada.
Nada.
Mas se ela quer saber mesmo sobre mim, eu tenho um cesto cheio de coisas que trouxe de casa da minha avó e que está intacto.
Ponho-o debaixo da janela do quarto, mudo-o para o corredor, trago-o para a sala.
Ali está ele, ainda por despejar, está lá um galo de barcelos, está lá a tesoura que o meu avô deu à minha avó há 50 anos, o proprio cesto foi ela que forrou e coseu uma bolsinha para guardar miudezas.
A hipoglicemia eu curei-a com açucar e hidratos de carbono lentos, as dores menstruais agora resumem-se a uma moinha, destas duas coisas só ficou o corpo moído e cansado.
A minha amiga deixou-me em casa, eu nem a convidei a entrar, sou uma pessoa horrível.
Porque o correcto era eu inventar uma história que metesse um rapaz e um futuro, chegar a casa e despejar o cesto e pôr todos aqueles objectos a uso, na minha vida do dia-a-dia.
quinta-feira, 11 de dezembro de 2008
Isto era muito mais divertido quando eu falava de amor
Tenho raiva em mim.
E sinto-me poderosa a falar em voz alta, convicta de que tenho razão, convencendo uma audiência que tenho razão, todos a olharem para mim e a achar meu deus, ela tem tanta razão que eu nem consigo desviar a minha atenção das suas palavras tão sábias, tão eloquente e tão interessante e profunda que ela é.
Hoje eu estava toda em tons de verde.
Um horror.
Mas ajudou-me no meu momento de arruaça, à hora de almoço, com as minhas colegas de trabalho rendidas ao meu discurso profissional inflamado (eu nunca te tinha visto assim), em ton sur ton.
É claro que ganhei, não havia nenhum debate, apenas uma tribuna onde eu expus o meu caso com tal vigor, que se fosse preciso, eu só precisava de indicar onde estava a guilhotina e de quem era a culpa.
No final, já a lavar a loiça, eu disse: não se assustem, eu não vou bater em ninguém, eu até estou toda da mesma cor.
Mas a vontade era muita.
Eu tenho medo de mim nesse aspecto.
Não sou violenta, não sou conflituosa, nem sequer me defendo como deve ser, não tenho aquelas respostas certas na altura certa, detesto discutir, não sou boa nisso.
Mas se me solta o mau génio, vindo dos meus antecedentes do Casal da Varzea, uns selvagens sem lei, se me solta esse mau génio, eu dou por mim com o dedo no ar a dizer às pessoas o que realmente acho delas.
E toda a gente sabe como isso é um erro.
Não é?
segunda-feira, 1 de dezembro de 2008
Um post ressabiado: eu até ia escrever sobre a chuva no mato...
E isso deixa-me, para além de envergonhada por pertencer a esse grupo que utiliza essa forma de enunciação, deixa-me triste e confusa.
Confusa como uma mulher (rapariga) a quem lhe dizem que o ex namorado, que ela pensava que ainda gostava muito dela (porque ele lho dizia) e que ela lhe tinha destruído a vida, teve pelo menos 3 casos enquanto ela teve 0.
(não é que isto seja um campeonato mas era inevitável a comparação...)
Ora bem, ele até pode dizer: sabes, eu sempre gostei foi de ti.
Mas essa rapariga não vai entender.
Pior, essa rapariga vai dizer: poça, mas isso é fascinante, podes dizer-me o segredo da tua eficácia?
Ele fica triste: não estás a entender, eu nunca deixei de gostar de ti.
E enquanto ele diz isto, vai contando mais outra e outra história que foi tendo: E se achas que tu estás resolvida na minha cabeça, estás enganada.
E quando essa rapariga dá por si, está mesmo irritada porque na verdade até fica mesmo contente por ele estar bem, porque isso significa que afinal ela não é uma destruidora de vidas, mas no fundo ela quer mesmo é bater-lhe, porque ele a confundiu ainda mais.
E um pontapé forte na boca surge como a agressão mais indicada, e quando ele estiver no chão a sangrar e gemer, ela já menos enraivecida vai dizer-lhe:
Eu acho o que eu quiser percebes?
E vai pisar-lhe as mãos com as botas, talvez lhe dê mais uns pontapés, talvez ainda lhe diga espero que corra tudo bem, depois então passa por cima dele e a próxima frase que vai dizer vai começar assim: "os homens..."
E andar no mato à chuva, de galochas, a apanhar bolotas é muito melhor que aturar estas conversas de merda.
Detesto que me conspurquem a vida.
domingo, 23 de novembro de 2008
Festival da Eurovisão ou durante quanto tempo eu consigo manter uma conversa internacional

Quando cheguei ao avião, ouvia-se Frank Sinatra e a minha primeira impressão foi: estas hospedeiras são um bocado freaks.
E, de facto, quando estavam a servir carne com batatas fritas às 16h, uma delas, a mais extrovertida, disse "esta merda" ao referir-se a um bocado de gelo.
E disse-o em voz alta e determinada, como se ela fosse uma hospedeira senior a ensinar às outras, subservientes estagiárias, o que se devia dizer quando fosse difícil pegar no gelo.
Deve fazer-se isso: dizer, Esta merda assim não dá!, em voz alta, para os passageiros ouvirem.
E a distribuição de sorrisos também não é gratuita: depende tanto da personalidade da hospedeira quanto do facto do passageiro merecer ou não...
Uma delas tinha 37 anos e trabalhava na Ground Force - tinha tentado muitas vezes passar a hospedeira mas recusavam-na por causa da espondilose. Mas agora, desde há 2 anos e meio que era hospdeira da TAP, tinha conseguido entrar quando menos esperava e já não ligaram à espondilose.
A seguir à aterragem, voltamos a ouvir Frank Sinatra.
Na verdade, há uma coisa que eu gostava de assimilar e pôr em prática na minha vida que passo a tentar explicar de seguida:
há alturas em que temos datas de exames, apresentações, desafios complicados e trabalhosos calendarizados nas nossas agendas mentais.
e então dizemos (eu pelo menos digo) assim: ai, vai ser tão bom quando chegar dia x às x horas, quando tudo isto tiver passado.
e desde a altura em que somos confrontados com o desafio até à data do seu termino ou desenlace (falo de coisas com datas marcadas), tendemos a não viver tanto.
Ou pelo menos faço isso: aliás, parece que faço mas não faço não é? porque uma pessoa não pode pôr a vida em pausa e depois voltar.
Posto isto: eu quero viver esses dias até essas datas como se não os estivesse a contar, indo fazendo as coisas e trabalhando sem pensar quero tanto chegar ao dia x.
É que assim perdemos tempo de vida, quando queremos que ela corra mais depressa.
E tudo isto nunca passa.
Como é mais que óbvio, eu quero que chegue quarta à noite, porque acho que vou respirar fundo, pelo menos por uns dias.
E sei também que aí o músculo vai parar e a lesão vai fazer-se sentir, com menos movimento.
Mas talvez depois da aterragem, eu comece a ouvir Frank Sinatra e afinal percebo que ainda estou a voar, com nuvens cor de rosa e hospedeiras freaks e um destino qualquer.
segunda-feira, 17 de novembro de 2008
É que eu acho que acima de tudo, eu ando estupidamente sensível
Quando ele me contou lhe ia escrever uma carta, senti-me no sopé de um vulcão de ternura.
Juro-vos que foi como estar na iminência de ficar submersa em ternura.
Ao sair do trabalho, eu ia a pensar na má sorte do meu amigo, percorrendo a lista de raparigas de quem ele já gostou e abanando a cabeça a pensar que ele não as sabia mesmo escolher. Confesso que até me deu alguma vontade de rir pelo seu padrão de escolhas.
Mas quem escreve uma carta de amor, ou antes, quem envia uma carta de amor, com um selo, num envelope... quem faz isso está condenado a viver.
Dizia-me um outro grande amigo meu, a propósito da linguagem tantas vezes detestável do apóstolo Paulo, dizia-me então ele que:
- Mas não sabes que as pessoas apaixonadas são muito complicadas?
Riu-se e coçou a cabeça e aposto que também ele escreveria cartas de amor se pudesse.
Saber que anda aí, num saco de correio, uma carta de amor a seguir o seu destino, deu-me alento.
A verdade é que manter a ternura na dor é difícil e para mim, só ter uma prova da sua existência foi suficiente para eu ter algumas saudades do futuro.
quarta-feira, 12 de novembro de 2008
O meu coração desfeito
O que a prima Celeste queria dizer era que até os ossos do meu avô eram bons.
Foi mais ou menos nesse momento que a minha irmã o viu.
Ali estava, meio desfeito, no meio da terra revolta, um sapato enterrado há 39 anos.
Um sapato do meu avô.
Eu sonhei com o meu avê na semana antes de ter sido diagnosticado cancro à minha avó (acho que até falei disso aqui no blog).
E quando me deram notícia da doença fatal, eu acenei com a cabeça, então era isto que ele me queria dizer.
Olhei para o sapato, pensei que devia pedi-lo ao coveiro Florêncio, pensei: tenho que mostrar à minha mãe, estava a chover e frio, estava ainda muita gente, eu ainda disse mãe, é um sapato do avô, acho que ela não percebeu, foi tudo horrível, eu sei, mas se eu não fizer qualquer coisa vamos ficar sem o sapato, vai ficar novamente na terra.
Não consegui pegar nele, nem pedi-lo ao coveiro.
Foi toda a gente embora.
Ficamos encostados uns aos outros (os 7, agora somos 7), a ver o final da vida, à chuva, a falar sobre o sapato.
O coveiro Florêncio ia contando que o meu avô lhe matou muitas vezes a fome, estava cada vez mais frio e nós cada vez mais tristes.
Reparamos então em quem estava agora (sepultada em Maio) em frente da minha avó:
a Rosara Chapina!
Começamos a rir, a Rosara Chapina era uma amiga da minha avó, com a qual ela tinha muitas aventuras, todas elas conhecidas por nós, eram as duas parecidas no essencial: não tinham vergonha de viver. (como eu tantas vezes tenho...)
E ali estavam agora as duas, o meu pai disse que de certeza que estão a brincar no céu, eu preferia ainda mais uns anos a ve-la na terra, eu ainda choro muito, ainda tenho muito para chorar, mas a minha avó era pragmática e nas suas últimas horas, ela fez um ruido, eu acorri, ela perguntou-me "o que foi agora?", "é que avó tem soluços e eu assustei-me", disse eu, a respirar fundo porque ainda não tinha chegado a hora e então ela disse, para que eu não me esquecesse:
"Soluços vão, soluços vêm
merda para quem os tem".
quarta-feira, 5 de novembro de 2008
terça-feira, 4 de novembro de 2008
no, I can
quinta-feira, 30 de outubro de 2008
Eu ia a subir a rua e eras a única pessoa suportável no mundo e isso tem o seu quê de ridículo
É que eu hoje não estou muito segura, isto é: eu hoje estou trémula neste mundo.
Não, espera, não estou a ser dramática, estou a tentar arranjar uma imagem que descreva o que sinto.
Portanto, é como se o meu andar, um pé posto no chão e depois o outro, nessa cadência instintiva, esteja influenciado pelo tremer do meu corpo.
Não é ansiedade, espera, não é bem isso. É um tremer de medo do que se avizinha que me faz ficar quieta na vida.
Quieta, entendes?
Porque perceber as coisas não as torna mais simples, nem lhes retira a tristeza.
Pois, isso, eu estou triste.
E também fragilizada.
E encolhida.
Se gostasses de mim, eu acho que era melhor.
Mas não gostas.
Tudo bem, hoje não é isso que mais me incomoda - isso faz parte de um todo (o mundo) que me assusta.
Pronto, eu não te vou conseguir explicar.
Nem me apetece.
O problema é que eu sei que podia falar contigo sobre o mundo, sobre tudo, tudo, tudo, tudo.
E ficar calada também.
E isso era bom, eu precisava disso hoje.
Assim, como eu estava a dizer, eu vou fazer uma coisa.
Vou abrir o mail e deixa-lo aberto, enquanto fico quieta, aqui ao lado.
Ele vai ficar aberto mas tu não vais aparecer mas assim é como se me fizesses companhia neste desterro (não te assustes com os meus adjectivos / nomes, sou só eu a procurar imagens).
Fica assim, está bem?
Não me agridas.
terça-feira, 28 de outubro de 2008
A minha alteração de rotinas
E há um determinado dia, uma tarde, um final de manhã, em que é dada aos meus olhos a possibilidade de ver as coisas "como elas são".
A Dra Cristina disse-me que eu era autónoma, eu fiz um ligeiro ar de desespero e disse-lhe mas ainda preciso da sua ajuda, e ela no fim da consulta abraçou-me.
A minha mãe também me abraçou, eu retribuí com força, era nítido que ela precisava.
A gata Jonas também levou um abraço mas ela devia ter andando a esfregar-se em alguma coisa muito mal cheirosa, de modo que foi um abraço menor.
Pus os meus braços à volta da nogueira e das árvores grandes, que fui trepando uma a uma.
Abracei a Cátia, a Raquel, a Gi, a Ana, a Mariana, a Susana, mais ou menos todas ao mesmo tempo.
Sim, é isso mesmo: eu acho que estou carente.
E quantos mais abraços der, mais recebo.
Mas ainda não é altura de falar nisso.
quarta-feira, 22 de outubro de 2008
Este vestido austríaco só me traz dissabores e eu não o quero usar mais

Descompensei.
E na sexta eu vou ter com a Dra Cristina e digo-lhe logo:
- Por favor, não vamos descarregar os valores da bomba, nem vamos olhar para as minhas análises.
Eu vou explicar o que aconteceu e a Dra Cristina depois tenha piedade de mim, mande-me embora, dê-me umas semanas que eu volto a equilibrar porque sinceramente agora estou péssima.
Hálito doce, uma ligeira nausea contínua, noites com má disposição, um descontrolo do apetite, ora muito ora nada, falta de energia, ora tudo muito baixo, ora tudo muito alto, sempre a ir fazer xixi, essas coisas todas.
Dra Cristina, eu sei que no início do Verão eu tive uma HbA1C espantosa, fui congratulada por toda a Associação de Diabéticos, 6,8% não é todos os dias que se alcança.
Eu sei, digna de poster, digna de paper em congressos sobre os benefícios da bomba de insulina.
Mas olhe para mim: engordei, já viu a minha pança e as minhas coxas, tenho aquele amarelo na cara, estarei possivelmente a criar infecções em vários sítios, eu nem quero ver a minha HbA1C, tenho demasiada vergonha.
Acredite em mim, isto descambou em Agosto e nunca mais foi ao sítio.
E a culpa é toda minha - isto é tudo da minha responsabilidade, nem é preciso mandar-me para o ensino com a enfermeira nem ir ter com a nutricionista para fazer um plano alimentar nem sequer fazer mais análises nem marcar consultas semanais.
Ambas sabemos, Dra Cristina, que eu não estou aqui nesta consulta a fazer nada.
Tenho mesmo é que me esforçar dia a dia, hora a hora, concentrar-me em fazer tudo direito, comer a horas, a quantidade de hidratos de carbono correcta, o bolus de insulina preciso, talvez nesta fase aumentar a insulina basal, fazer mais testes, gastar mais tempo com isto e ter paciência e preserverança.
Eu sei que consigo.
Também não é que tenha alternativa, não lhe parece?
Mas acabei por não lhe contar o que se passou para ter descompensado, não foi?
Também não sei se interessa muito, pronto, na verdade aconteceram algumas coisas mas não consigo falar nelas - eu ainda não falei muito sobre elas.
Não é preciso fazer esse ar, Dra Cristina, não tenha pena de mim. Se eu ando descompensada a culpa é minha - irrita-me isso nesta doença, sabe?
Queria muito não ter culpa...
Já sei: mande-me para o psicologo clínico Dra Cristina, a sério, eu quero ir.
Ou então passe-me aí um papel e eu envio a uma certa pessoa que não se apaixonou por mim como devia.
Não se ria, Dra, que o assunto é sério!
Acredita que ele em vez de me ajudar - a mim, pobre de mim, doente e desgraçada - foi-se embora sem dar notícias, sem querer saber se eu estou bem? Dá para acreditar?
Passe aí uma receita, que depois eu vou buscar a vinheta lá na recepção, escreva aí com letra legível se conseguir, escreva como eu sou uma alma perturbada, desamparada e carente, escreva aí como o facto de ele não gostar de mim fez disparar a minha hemoglobina glicosada. Já agora declare que, para os devidos efeitos, eu sou uma mulher (é que não sei se ele sabe), que sou uma mulher para a vida, e que apesar de tudo eu nem dou assim muito trabalho, que eu sei tomar conta de mim e que eu vou conseguir compensar, atingir novamente uma HbA1C maravilhosa - vamos apontar para 0s 7,5%, sim, Dra Cristina? - e pronto. Que eu me lembre, é só isso que preciso da farmácia.
terça-feira, 14 de outubro de 2008
O pior salmão que já comi

E estava Jesus Cristo no jardim com os seus amigos quando chega um deles e lhe diz, com grande à vontade:
- Oh Jesus, dá cá dois beijinhos!
E foi nesse preciso momento que Ele pensou: pronto, está tudo acabado!
E se eu fechar os olhos consigo ver a cara com que Jesus ficou quando aquele sonso lhe deu dois beiijinhos.
Foi a mesma cara com que eu fiquei quando uma vez dei boleia a um rapaz a quem gostava de fazer cócegas, entre outras coisas físicas, e então dei-lhe boleia a ele e a uma "amiga", muito moderna e gira, com franja e casaco preto, e eles sairam os dois do meu carro e ela deu-me dois beijinhos a agradecer a boleia, e ele disse: Dá cá dois beijinhos! E eu, feita estupida, dei.
Quando arranquei com o carro dei por mim a pensar: houve qualquer coisa que não correu bem mas não consegui bem ver o que foi.
Vi dois dias mais tarde, vi que eles afinal estavam juntos.
Bem, e agora, mais recentemente, com maior gravidade, outros dois beijinhos me foram pedidos
Na verdade eu não consigo lembrar-me de como tudo aconteceu, não sei se foram mesmo pedidos,
Se foi só o sinal universal para: vamos dar dois beijinhos,
Se houve um braço qualquer a pegar no meu (não, acho que isso eu lembrar-me-ia),
Não consigo precisar, tento rever esse momento na minha cabeça mas não consigo.
Mas, mas mas mas mas mas
MAS
sim, houve dois beijinhos
chuac chuac
E nesse preciso momento o que eu devia ter feito, se não estivesse sob o efeito de uma droga qualquer que ele colocou no ar à sua volta e que me paralisou totalmente o cérebro, o que eu devia ter feito era ter parado aquele inclinar caracteristico dos dois beijinhos, parar com alguma força, empurrar com alguma violência, mandá-lo ao chão e dizer:
- Não, com dois beijinhos é que não.
Mas em vez disso, eu dei dois beijinhos, a concordar, a selar o fim.
E agora, hoje ao jantar, eu ia comer salmão e eu adoro salmão grelhado com feijão verde e criei expectativas acerca do jantar e então o que aconteceu foi que o salmão era mesmo muito mau, era o pior salmão de sempre e, no meio das garfadas eu pensei:
-Terá ele razão? Expectativas são desilusões? Ou sou só eu que não sei escolher peixe?
segunda-feira, 13 de outubro de 2008
Na estrada de Damasco
Tudo se tornou então claro para mim: Oh meu Deus, ele não gosta de mim.
Como uma pecadora no momento da conversão, escancarei a boca e abri muito os olhos, acho até que me babei ligeiramente, e senti-me tão lúcida que me enchi de vergonha.
Fiquei envergonhada da cabeça aos pés.
A "situação" surgiu-me perante os olhos com toda a clareza, com toda a crueldade, com toda a verdade.
Este momento nunca é agradável, pensei eu.
Este preciso momento nunca tem grande graça.
E, à medida que o autocarro ia subindo a rua, uma mãe batia nas filhas, um senhor ao meu lado abanava a cabeça, um outro dormia e eu ia deixando de ter os olhos tão abertos.
Limpei a baba e limpei o ranho. Abri e fechei os olhos, mexi-me no banco.
Fim da epifania.
Convertida?
Vamos a contas:
lucidez: 85%
esperança: 65%
Por amor de Deus, Madalena, continuas em negação???
Sim, estou em negação:
Gosta de mim: 20%
Não gosta de mim: 60%
Gosta mais ou menos: 70%
Mas se queres saber, pessoa-com-quem-eu-falo-quando-estou-sozinha-e-que-no-fundo-sou-eu, eu neste momento estou mesmo envergonhada e neste momento acho mesmo que ele não gosta de mim e invade-me um sensação de pânico, como aquela que se tem antes de fazer um exame doloroso.
terça-feira, 7 de outubro de 2008
Amorzero

Os meus flirts transformados em cães de loiça enviam-me mensagens ternurentas notando a minha ausência no trabalho.
Com a casa em arrumações, cola branca, ferramentas, madeira e tinta à mistura, eu penso, sentada no chão da sala: realmente, o grau zero do amor tem alguma coisa de reconfortante.
Mas depois continuei a pensar (e é um erro continuar a pensar): será que também "este" se vai tornar num cão de loiça? ou será que eu estou a expiar todo o mal que já causei a quem eu abandonei, mesmo sabendo que gostavam de mim? será que devo comprar um cão de loiça para a minha sala?
Lembrei-me de Livro de Coeleth.
Será este o meu tempo para evitar abraços?
À tarde, abri uma caixa que tinha posto na prateleira da minha mesa de cabeceira.
Estava cheia das minhas coisas.
A vaquinha que dorme, o anjo de madeira, o boletim de vacinas, o livro com coisas e orações, fotos das árvores, enfim, todos os objectos que estavam ao pé de mim quando ia dormir.
Como é que eu fiquei estes meses todos sem abrir a caixa?
Agora, no meu quarto, estou mais acompanhada.
Coeleth era um doido.
Eu, Qohélet, fui rei de Israel, em Jerusalém, apliquei o meu espírito a estudar e a explorar, pela sabedoria, todas as coisas que sucedem debaixo do céu. É uma tarefa ingrata que Deus deu aos homens e os oprime.
Vi tudo o que se faz debaixo do Sol
e achei que tudo é ilusão e correr atrás do vento.
Apliquei, igualmente, o meu coração a conhecer a sabedoria, a loucura e a insensatez; e reconheci que também isto é correr atrás do vento.
Porque na muita sabedoria há muita arrelia, e o que aumenta o conhecimento, aumenta o sofrimento.
Há também aquela parte muito bonita, acerca do tempo para isto e para aquilo.
No fundo, acerca do tempo favorável.
Todas as coisas que Deus fez, são boas a seu tempo.
Coeleth, após ter procurado uma experiência humana completa (entreguei-me ao vinho e aferrei-me à loucura) diz o seguinte:
Eu concluí que nada é melhor para o homem do que folgar e procurar a felicidade durante a sua vida.
Assim seja.
quinta-feira, 2 de outubro de 2008
0 - 0 pode não ser um empate
Bom, ocorreu-me que isso pode estar relacionado com o facto de não dares notícias.
Porque repara, e isto é tragi cómico, sinceramente dá-me vontade de rir, porque repara (até tenho que parar para rir um bocado).
Repara que enquanto não olhaste para mim, mantinhas contacto frequente.
E depois de olhares, é o que se vê.
Nem uma prova de vida.
Eu bem sei que me foge o pé para o drama e que promovo e crio o floreado do enredo, sei que tendo a analisar tudo errado, a esquecer pormenores como "só passaram uns dias" ou "não és importante para ele" ou ainda "não te parece que ele deve ter mais que fazer?" mas mesmo assim, mesmo assim (e agora já não estou a rir tanto) mesmo assim dou por mim a pensar, é inevitável que não o faça, que tu olhaste para a minha cara. Eu vi.
Até sei dizer a esquina onde isso aconteceu.
Eu há bocado fui até ver-me ao espelho mas a luz da minha casa de banho é muito fraca.
Será que tenho muitos pêlos faciais? Eu não sei se és dos que liga a essas coisas...
Será que se nota a quantidade brutal de cabelos brancos? Talvez tenha parecido uma criatura demasiado estranha, velha e criança ao mesmo tempo...
E estes dentes amarelos?
Não sei o que viste porque também não mo dizes.
Eu não entendo nada.
(dou por mim distraída, às vezes durante o dia, a abanar a cabeça e encolher os ombros e a murmurar: não entendo)
Ou se calhar até entendo mas não quero aceitar.
Sinceramente, eu queria até dizer-te isto tudo, percebes?
Mas assim não sei, parece-me que não queres ouvir.
Não me quero impor, não acho correcto e queria manter alguma dignidade altiva, não ser a mesma tola desbocada de sempre.
Por isso pega nesse teu não-gostar e leva-o para longe da minha cara porque eu não sei fingir que isso não me deixa triste.
quarta-feira, 1 de outubro de 2008
Manda-me uma carta em correio azul para afastar estas 5 nuvens negras
-Então, esse alívio?
Eu olhei para ela:
- Alívio algum, minha cara, alívio algum.
Pensei que, por esta altura, eu fosse gritar a todos: beija-me porque terminei a tese, mas em vez disso, ficamos a olhar uma para a outra, eu e a dita, sem qualquer suspiro, sem qualquer alegria.
- Mas o que foi? - disse ela um bocadinho indignada, quase nada, mas um bocadinho - é porque ainda tens que ver as gralhas e corrigir a formatação?
- Não, isso são só mais umas horitas, não é isso.
Encolhi os ombros sem grande energia.
Ela olhou para mim mas também não estava surpreendida com a minha falta de excitação.
Ambas sabemos que os meus problemas neste momento são outros.
- És uma boa companhia, assim pronta - disse-lhe eu e dei-lhe uma festinha.
Mais ao final da tarde, do carro da minha tia, a minha muito doente avó e a minha muito triste mãe, todas me acenaram.
Separamo-nos à saída de Santa Maria.
Eu para casa.
Elas para casa.
E depois a minha saia de seda, as minhas sandálias, tudo me pareceu roupa a menos.
Com a tese agarrada ao peito, eu pensei:
-Realmente, a dor não serve absolutamente para nada.
Para nada.
Por isso, manda-me uma carta em correio azul, sergio godinho, que hoje chegou o Outono.
domingo, 28 de setembro de 2008
E a irmã da noiva? Já a viste?
Sim, levava.
Eu era a "irmã [solteira] da noiva", essa personagem mítica dos casamentos.
Bom, mas o que interessa é que, no dia do casamento, o meu pai viu-me a encolher a barriga - o vestido era justo e eu tinha vergonha da minha pancinha.
Disse-me:
- Se assumires que tens barriga, vais ver que ficas melhor.
Lembro-me disso muitas vezes, em relação a muita coisa.
Quando eu assumo as minhas pancinhas, sou muito mais feliz.
E mais livre.
quarta-feira, 24 de setembro de 2008
Na minha ingenuidade sem fim, eu às vezes tenho que me calar
Eu vinha ao lado do Pedro, eu já gostava muito dele.
Ele estava bêbado, eu estava só contente por estar sentada ao pé dele.
O Pedro começou a cantar o Running to stand still dos U2 e, nessa altura, os U2 eram importantes para mim.
Ele disse:
- Não achas esta música bonita?
Eu disse que sim, toda contente por um bêbado estar a falar comigo, com o seu halito podre para cima de mim, prestes a vomitar.
Ele tocou-me na cara e encostou-se a mim, deu-me a mão.
Eu retraí-me e perguntei:
- Porque é que estás a fazer isso?
Estava ali a lavar a loiça e a tentar lembrar-me da resposta dele, mas não consigo.
Nem sei porque me lembrei deste episódio.
Sei que eu queria mesmo saber a razão pela qual ele se estava a aproximar - acho que era por causa do alcool.
E, em caso de duvida, pergunta-se.
Pergunta-se: posso gostar de ti mais do que devia?
Pergunta-se: posso ser sincera e usar o coração no lugar da boca quando falo contigo?
Pergunta-se: posso perguntar-te estas coisas todas?
Pergunta-se: posso saber porque estás a fazer isto?
É que às vezes podes ter bebido demais.
terça-feira, 23 de setembro de 2008
Assuntos do coração

Tenho um certo medo dado o desassossego em que vejo o meu coração.
Nas palmas das minhas mãos, ele não pára de tremer.
Senhor, que fostes enviado pelo Pai para salvar os corações atribulados, resgata agora o meu.
Preserva-o da turbulência destes dias tão inesperados, defende-o antes que ele fique irremediavelmente preso.
E se esta tentativa de melodrama não te comove, Senhor, olha bem para mim.
Achas que eu sei lidar com estas arrelias?
Achas que sei ter calma?
Achas?
Achas mesmo?
Olha para mim, olha aqui, olha que tirei o coração e está nas minhas mãos, e tento não o deixar cair enquanto agarro outras coisas.
Pega-lhe tu, Senhor dos corações apoquentados, pega no meu coração, segura-o um bocadinho, só até ao Natal.
Depois eu acho que consigo voltar a colocá-lo no peito.
Agora fica Tu com ele.
Porque se ele continua em meu poder, eu ofereço-o a quem o tocar.
E tenho um certo medo que lhe toquem.
A minha vida afinal é pouco glamorosa
Hoje foi bom ter ido de vestido.
Era mais ou menos isto que eu devia dizer:
- Tenho um certo medo.
Dizia só assim, com firmeza e segurança:
- Tenho um certo medo.
E nem era preciso dizer muito mais, talvez a minha cara não me traísse e se notasse que estou a ser invadida por uma certa sensação de pânico.
Por isso eu devia dizer:
- Tenho um certo medo.
Mas não dizia mais nada.
Hoje nem vou dizer mais nada.
domingo, 21 de setembro de 2008
Este ano não vou vindimar
Eu também falei, mas acho que ouvi mais do que falei.
As pessoas precisam de falar.
As pessoas precisam de expiar.
As pessoas precisam de rematar.
Da última vez que fui buscar catateres para a minha bomba, enganei-me e trouxe uns com um fio (tubo) muito comprido. De manhã estou sempre emaranhada - sinto-me presa logo de manhã.
Disse ao meu irmão:
- Eu ainda não tive tempo para pensar sobre as consequências de estar sempre ligada a uma máquina
Ele disse:
- Se fosse eu, teria mantido as injecções.
Suspirei eu:
- Tenho saudades do meu psicologo.
Pela primeira vez em meses, senti-me um bocadinho saturada, irritadiça com a bomba.
Acho que foi por causa da extensão do tubo.
Tenho uma televisão e um rapaz está a dizer que sim com a cabeça.
E se ele tivesse uma bomba e uma avó doente, como será que ele fazia?
Estas pessoas assim, com tão bom aspecto, com um aspecto inteligente, sabem o que querem na vida, sabem coisas que eu não sei, sabem tanta coisa.
Amanhã é segunda e eu não vou usar vestido.
Por causa da bomba.
Pelas 12h30 eu verifico como estou.
Se afinal gostava de estar antes com um vestido.
quinta-feira, 18 de setembro de 2008
Se eu fosse um objecto seria ser uma má decisão
Bati palmas e dei um gritinho: Yeah, adoro decisões. É de trabalho ou de vida?
- De vida, da minha vida, e vai começar em Novembro.
- Uau, data marcada e tudo...
Eu também tomo decisões mas quase nem se nota.
Este ano terminei uma relação, saí de casa e coloquei uma bomba infusora.
Ah, é verdade, e "decidi" terminar a tese.
Se olharem para mim, nem dão conta.
Sou uma excelente escondedora de coisas profundas.
Enquanto ela me contava da sua boa decisão, senti a determinação na sua voz.
Fiquei contente, gosto quando isto acontece.
Isto: alguém me contar que tomou uma decisão e de assim irem "acontecer" coisas, coisas decididas, somos seres que determinam coisas, somos mulheres na flor da idade, sabemos o que queremos e se é Novembro ou Julho.
Acho isso o máximo, entusiasma-me, aproxima-me de Deus.
Outra coisa que tenho vindo a pensar, às vezes, nem sempre mas algumas vezes, é que se fizermos alguma acção, temos mais hipoteses de obter uma reacção.
A minha travessura matinal (que não devia ser feita assim tão cedo, quando eu ainda estou sem filtro algum e portanto mais apta a fazer merda) foi executada porque eu tinha tomado a decisão que a ia fazer.
Tive alguns sinais para não fazer mas fiz.
Por isso, vamos Benfica, ainda temos a segunda parte para jogar em casa.
Eu acredito, eu decido.
Mas eu tenho esta coisa que acho que a faixa da esquerda não é para mim.
Eu não me sinto como pertencente ao grupo de pessoas que habitam a faixa da esquerda.
Tudo bem, eu vou lá de vez em quando, eu finjo que até sou de lá, faço um certo ar como se fosse normal eu lá estar mas a verdade é que eu a faixa da esquerda não é o meu habitat natural.
Hoje é quinta.
Um dia a seguir ao outro.
Mais uma horita e tal e passamos a sexta.
quarta-feira, 17 de setembro de 2008
Como eu não gosto de solas finas não as devia usar não é?
Foi bom ter-me lembrado de encher a garrafa de água e tê-la perto da cabeceira.
Desde que a minha avó adoeceu eu vivo mesmo dia a dia.
Isto é: não penso com muito avanço e digo muitas vezes para mim própria "amanhã logo se vê".
O tempo foi passando, e estou já a fazer uma revisão final da tese.
Revisão toda mal feita, a minha tese precisava de 5 minutos à Benfica para deixar de ser mediana para passar a ser uma coisa de que me orgulhe de ter feito.
Tenho conhecido muitas idosas, amigas que a minha avó vai fazendo no hospital.
A dona Guilhermina estava sempre a despir-se, explicou-me que o pai dela estava nas filmagens, e ia chegar não tarda nada. Disse-me que tinha 17 anos e que a irmã mais velha dela tinha 16.
Teve alta ontem, hoje já havia novas idosas mas acabei por não conhecer nenhuma e fixei-me no objectivo de tentar fazer com que a minha avó não se incompatibilizasse com as auxiliares nem com as enfermeiras.
-A avó não pode ser a arruaceira da Medicina 3, acha que isso está bem?
Mas vejo-me a dizer isto a alguem muito fragilizado e acrescento logo a seguir:
- Mas se vir que a estão a tratar mal, também não se deixe ficar.
A dona Anastácia, que estava caída com uma hipoglicemia daquelas, acordou e acenou com a cabeça:
- A sua neta tem razão.
Entretanto olharam as duas para os meus pés e viram que eu tinha sandálias.
Chegaram os meus tios, eu vim embora.
Eu hoje vi que estava assim meio cinzento mas mesmo assim levei as sandálias de sola fina.
Ia caindo duas vezes, não foi agradável.
Eu prefiro solas fortes, onde a planta do pé não sinta o chão mas as minhas sandálias boas cheiram muito mal, e tenho medo que alguem perceba que vem de mim.
Não sou assim tão moderna nem tão segura.
A lida da casa está toda em atraso e tenho muitas saudades de costurar.

A meio da tarde, eu lembrei-me de uma musica para cantarolar: Dona, dos Roupa Nova
Tan, tan, tan, batem na porta
Não precisa ver quem é
Pra sentir a impaciência
Do teu pulso de mulher
A letra é muito intrigante e eu sempre achei que os senhores se estavam a referir a uma mulher chamada Dona ou então a Nossa Senhora.
Amanhã é quinta.
Talvez faça uma travessura para animar o dia.
domingo, 14 de setembro de 2008
Lisboeta alfacinha come merda de galinha
Tenho a impressão que estamos em Maio.
Tenho esta impressão há meses, desde Abril, talvez.
E se me apaixonasse loucamente?
Assim andava entretida com outras coisas sem ser as que ando agora.
Mas se calhar estou numa "daquelas alturas" em que não me encontro disponível para amar.
Domingo à noite e não gosto de passar a ferro.
Contudo, gosto de marmelos cozidos, de chá de hortelã pimenta e de beijinhos.
Se agora eu me apaixonasse, talvez não fosse por um idiota como da última vez.
Mas nem consigo pensar nisso sem um certo asco.
Vou aproveitar agora para ligar o ferro e passar as peças que acho que me sentirei desconfortável a vestir se não estiverem engomadas.
Vou aproveitar agora para não me precipitar em relações parvas, em flirts inconsequentes, em mini desgostos, que saem com água como se fossem shampoo.
Nunca deixarei de ser uma saloia, a perguntar por segorelha em todo o lado para fazer sopa de feijão verde.
Estamos em Setembro não é?
Por isso se calhar o melhor é esquecer ir passar a ferro e ir antes cortar as unhas.
Porque hoje também já não me devo ir apaixonar, ainda bem porque acho que o jantar não me caiu lá muito bem.
segunda-feira, 8 de setembro de 2008
A minha mãe também é filha e eu também não estou bem
Mas não havia flores cor de rosa no quintal que eu pudesse apanhar para fazer a jarra.
Fiquei encostada à escada do sótão, a que tem a glicínia, e chorei.
Chorei porque tive medo, eu acho que o pior é o medo que temos de que as pessoas que gostamos morram misturado com o medo que temos de morrer.
Só havia dálias, algumas muito bonitas, apanhei-as mas a jarra era muito grande.
Eu tratei de tudo enquanto estavam no hospital, eu só parei à noite porque a noiva não tinha a culpa, pensei eu: ela coitada não tem culpa, vai-se casar e sabe que a vida não é fácil, merece que eu varra o quintal e limpe a casa, merece que eu corra a comprar flores, que eu decore o carro do meu pai, todo riscado e amolgado, merece, claro que sim.
O vestido lá pendurado não me dizia grande coisa, nunca me comovo com vestidos de noiva, acho eu.
No domingo de manhã cedo, enquanto fui buscar o bouquet, ainda tentei ir à farmácia, antevendo que ia ficar sem insulina mas estava tudo esgotado ou fechado.
Isto não vai correr bem, pensei eu, enquanto tirava fotografias à noiva e aos padrinhos, perto dos malmequeres altos e amarelos.
Tirei a bomba, andei sem ela durante o dia, voltei às injecções com nph e achei que ia conseguir controlar a glicémia mas quando dei por mim, pelas 14h já estava cheia de nauseas e a pensar: o melhor é eu ir arranjar uma farmácia....
Ora a boda foi na Cachoeira, uma aldeia bem dentro dos montes da região oeste, e saí do casamento discretamente, fazendo a minha irmã prometer que não dizia à minha mãe que eu estava totalmente descompensada.
Depois de 3 farmácias com a insulina esgotada e de bastantes km percorridos, dei por mim no meio de Odivelas, num bairro refundido, de fato de casamento, uma merda de uns saltos de agulha e um vestido que a minha mãe me emprestou de seda verde, e arranjei finalmente insulina.
Regressei a casa... quer dizer, ao quintal, não à minha casa nova mas a casa, onde tinha as minhas coisas.
Pus a bomba e fiz a correcção - aterrei no sofá pelas 19h, não me lembro de grande coisa, só do meu irmão chegar e dizer qualquer coisa, que eu tinha que tomar conta de mim e que não devia ter ido sozinha.
- Provaste o porco grelhado? perguntei
- Sim, estava bom.
- Pois, eu ainda estou agoniada mas estou bem.
Levantei-me e fui ouvir a minha tia a contar da tarde dela no hospital e o domingo acabou com a minha mãe a ser filha e eu a ser doente.
domingo, 31 de agosto de 2008
31 de Agosto: Come este figo que o ar do campo faz-te tão bem
- Ora essa, faz parte do meu trabalho - disse eu
São fases mais complicadas - acrescentei e baixei os olhos, tive medo que ela chorasse. Tinha o cabelo um bocado desgrenhado, faltavam-lhe as palavras, tinha caído no abismo do conhecimento bibliográfico ao aperceber-se, após fazer pesquisas, que há milhares de coisas para ler, e a vida são só 3 dias.
Tive pena dela.
Não por causa da bibliografia, quem lhe manda a ela ir pesquisar "associativismo" e ciência política" em bases de dados internacionais.
Tive pena por ela estar envergonhada da sua figura, da sua fraca figura.
Eu devia ter pegado na mão dela e ter-lhe dito:
- Ouça, eu acho que se a menina estivesse mesmo mal, não andaria bem vestida como anda. Pronto, talvez esse cabelo não faça o seu estilo, talvez faça parte da sua rotina pentear-se e agora nesta sua "fase " não o consiga fazer. Mas repare como ainda tem o cuidado de escolher a roupa interior adequada para essas calças de linho brancas que usa. Está muito apresentável, só quem olhar com muita atenção verá que está desleixada.
Devia também dizer-lhe também que me compadecia dela porque
- Eu já passei pelo mesmo, eu já disse a pessoas que não me estavam a conhecer na minha melhor fase, já o disse até muitas vezes, até entender que as fases são boas e más ao mesmo tempo e até me aperceber que as fases boas foi aquela tarde em Julho quando eu consegui construir uma cabana ou quando a gata Beca me deixou filmar o parto dela num início de primavera ou mesmo quando o meu cabelo estava mesmo fixe num dia em Novembro acho eu. E houve um serão quando eu fiz uma princesa-fantoche muito simpática.
Nesse instante é que eu devia ter conhecido toda a gente que há nesta vida para eu conhecer para me apanharem numa fase mesmo boa.
Para próxima eu salto do balcão, abraço-a e digo-lhe:
-Eu também tenho vergonha das minhas fases de desânimo e de pressão.
E mostro-lhe umas cuecas cor de laranja e um soutien preto por baixo de um vestido transparente.
sábado, 23 de agosto de 2008
Quando eu for uma mulher, saberei lidar melhor com estas e outras situações
- Oh filha, pra que é que queres isso? É muito fácil: compras daquelas capas de baixo coloridas, do tamanho do teu colchão, e usas pra cima os que quiseres.
- Pois é.
E olhei para o Estádio de Alvalade, da janela do Pulido Valente, e abri bem os olhos para não chorar ao pé dela.
sexta-feira, 8 de agosto de 2008
O muro é de lamentações, não é de súplicas

Sentada na sala de espera do último piso (o das crianças e dos bombistas) eu olhava para a televisão, metade interessada, metade ansiosa por estar a perder tempo útil de trabalho (não cumprir os horários que faço para mim própria causa-me subtis mas intensos ataques de pânico - os meus traços obssessivo-compulsivos às vezes assustam-me).
Foi quando desviei o olhar da televisão para o desenho do mickey, com certeza mickey diabético, que veio aquela sensação estranha quando nos lembramos dos sonhos.
Meu deus, sonhei com o meu avô. Ele tinha chapéu e fato de riscas.
Nunca conheci o meu avô paterno mas durante a noite eu estive com ele e ele era uma pessoa diferente da que me dizem que ele era.
Mostrei-lhe a minha casa nova, tentei leva-lo a ver a minha mãe, ela ia ficar tão contente ao sabe-lo vivo.
Andamos em edificios de pedra, com grandes e austeras varandas mas eu sofria muito.
Não quero mais recordar este sonho, foi demasiado intenso.
A noção de que o meu avô me apareceu em sonhos porque me quer dizer qualquer coisa desinquietou-me durante toda esta sexta feira.
Lembro-me sempre do "Nazareno", uma opera rock do Frei hermano da Camara, onde a Amália fazia de Madalena e havia a famosa cena dela ir ter com Jesus e todos ficarem a olhar por ela ser bonita (na minha versão é bonita em vez de prostitua). E essa cena tem uma musica que é:
Eu sonhei em sonhos que aí com Simão, jantavas oh Cristo de faces radiosas, e trago-vos cravos, trago-vos rosas...
É que Deus resolvia muitos assuntos através de sonhos.
Antes de ir para Israel, a minha mãe disse-me:
- Escreve um papelinho para eu pôr no muro das lamentações. Eu não o leio.
Mas eu perguntei:
- Mas é pra escrever uma lamentação ou uma prece?
- Uma prece - disse ela, como se toda a vida tivesse ido deixar recados no Muro (se calhar toda a vida o fez mas a sonhar).
Lamento, prece, suplica, pedido, oração não são coisas exactamente iguais e não me parece justo encher o muro das lamentações de pedidos.
Escrevi então um pedido no papel dos recados telefónicos e dei à minha mãe, dobradinho em 6.
Se calhar mais valia ter feito um lamento concluindo com uma nota a Deus a dizer:
- Se és Deus, deves saber melhor do que eu o que afinal preciso. Eu dizer problemas até consigo mas as soluções nem sempre são claras para mim.
Como os sonhos.
sexta-feira, 1 de agosto de 2008
Não me apetece aspirar, faz demasiado barulho
Tenho a casa suja.
Tenho a vida desarrumada.
Tenho pêlos nas pernas.
Tenho uma ferida na nuca.
Tenho o cabelo comprido.
Tenho o crochet por fazer.
Tenho um chapéu de palha cor de rosa.
Tenho um boné caqui com um laço.
Tenho um vestido de hospedeira.
Tenho uma pinça ferrugenta.
Tenho uma tese para acabar.
Tenho loiça pra lavar.
Tenho um amor por resolver.
Tenho uma bomba para encher.
Tenho uns pés calejados.
Tenho uma família com problemas.
Tenho um chão de bamboo.
Tenho uma gata longe de mim.
E nem sequer gosto de ervilhas.
terça-feira, 29 de julho de 2008
Sem ti na minha equipa sinto-me desprotegida Cíntia Petit
Tive uma cacta chamada Cíntia.
Chamei-lhe assim porque ela cintilava ao sol.
Era muito fofinha e eu dava-lhe muitos beijinhos.
Era uma excelente conversadora.
Não me lembro que idade tinha eu, 13 anos talvez.
Levava-a para todo o lado.
As pessoas achavam um bocado estranho mas não se desmanchavam.
- Que cacto tão lindo que trazes aí!
- É uma cacta!!
A Cíntia foi brutalmente assassinada pela cadela Nikita, que agora tem cataratas e está cega de uma vista. Os seus dentes estão a cair e está num estado entre asqueroso e deprimente, tadita.
Ter a Cíntia do meu lado era ter força, ela era uma soldada, o meu braço direito na guerra da vida.
Agora tenho uma planta que a L. me deu, com flores brancas muito lindas, e um vaso onde plantei agriões, outro com salsa que espero que cresça e outro ainda com uma batata doce, de onde brotam folhas verdes em abundância luxuriante.
Falei hoje com a minha avó sobre hortelã e avenca e outras plantas mas ela disse-me que "isso não eram assuntos para se tratar por telefone".
Se eu sair de casa alguns dias, vou levar as minhas plantas comigo, para elas tomarem conta de mim.
Por isso, Petit, pensa bem no que estás a fazer ao ires embora assim.
Toda a gente precisa de um pitbul na sua equipa ou de uma cacta na sua vida.
Toda gente deve ter uma cacta chamada Cíntia, um Petit na sua equipa, uma avó a falar apenas em agudos, um sofá para ver televisão, um bidé para o que der e vier, um copo de água, um pacote de lenços, uma rua para andar, um abraço quando o Benfica marca, uma porta para fechar com força, uma carícia matinal, salsa, louro, coentros, sal, alho, limão, cobertores, leques e tapetes fofos, toda a gente deve ter um amor correspondido para protecção e bem estar.
quarta-feira, 23 de julho de 2008
Peso 64 kg: so what?

No programa da Tyra Banks que hoje está a passar na Sic Mulher, acho que combinaram vir todas de vermelho.
A Tyra engordou e falou disso na revista People.
E então estão muitas senhoras de fato de banho comprido, vermelho, e com o peso escrito a branco.
Todas elas estão muito contentes porque a Tyra disse que pesava 73 kg mas que se sentia hot na mesma.
Gritam: as minhas coxas roçam uma na outra, so what? E todas batem palmas.
Também eu estou muito feliz.
Este programa é fabuloso, mas eu sou facilmente impressionavel.
Doi-me a cabeça, não me sinto nada hot.
Passo muitas horas com valores baixos de glicemia, sem fazer descidas nem hipoglicemias mas mantendo sempre glicemias baixas durante a tarde, porque a bomba estabiliza os valores.
Ora isso, para além de dar uma valente enxaqueca, dá-me uma moleza muito grande.
Eu e a minha bomba estamos cansadas, e um bocado desanimadas, mas a Tyra disse que é importante fazer uma alimentação saudável e, ao mesmo tempo, devemos deixar que o nosso marido nos leve a um bufete e podemos repetir o prato e mandar um video para o programa dela.
Estas senhoras todas vestidas de maillot vermelho deram-me alento para amanhã ir trabalhar de cabeça erguida.
É que as minhas coxas também roçam uma na outra e, para alem disso, eu gosto de tirar macacos do nariz.
Vou enviar um video de mim a tirar macacos e a coçar-me à Tyra.
Pode ser que me convidem para o seu programa, de maillot cor de rosa.
quinta-feira, 17 de julho de 2008
Sempre quis ser escriturária e levar almoço todos os dias para o serviço
Quando o chefe me chamou a segunda coisa que pensei (a seguir a dar graças a deus que por não lhe ter atendido o telefone a dizer o que foi agora cacete) foi: merda, logo hoje que estou com as mamas à mostra, merda, mas porque é que eu resolvi armar-me em despudica e não vesti um top que me tornasse mais condigna.
Lá fui eu, lá ouvi o que ele tinha para dizer, alguns excelentes nas relações interpessoais, ele ia falando coisas desinteressantes e eu tentando acompanhar a minha avaliação. Mas era muito aborrecido.
Depois ele disse: agora as coisas vão mudar e o comportamento e atitude já não vão ter uma avaliação própria (eu isso retive: tou lixada, eu sou mesmo boa é em sorrir para as pessoas e falar sobre futebol com o senhor Dias da secção de pessoal e sobre gatos com a Celeste das edições e sobre qualquer coisa com o Zé da contabilidade. Cubro muito bem variados assuntos, mantenho uma conversa espirituosa, sem maltratar nem melindrar ninguem, por vezes armo-me em integra e mando umas bocas com ar sério mas isso é só para me dar algum carisma e nem sequer acho que funcione, as pessoas tendem a ignorar-se umas às outras, acho isso muito saudável).
Eu vou escolher consigo, continuou ele, 5 (acho que eram 5) dentre esta lista de 17 (que numero tão estupido, 17, será que eram mesmo 17, era uma lista numa folha A4 e pareceu-me ouvir um 17) competências para a avaliarmos no proximo ano. Isto para além dos objectivos quantitativos que a sua chefe já me entregou (ora aí está, assim é que é fixe: se eu tiver quantidades para atingir eu sinto-me muito mais motivada).
Se não concordarmos, disse ele, eu é que escolho.
Eu ri-me, pensei que era uma piada mas ele acrescentou com voz grave:
Não se ria, é assim mesmo que está na lei.
E eu endireitei-me na cadeira e puxei o decote pra cima.
E pensei: pah, se calhar agora era uma boa altura para lhe dizer que eu consigo beber uma garrafa de água de (pelo menos) 0,75 l de penalti e não fico mal disposta - essa podia ser uma das minhas competências.
Autonomia no desempenho das minhas funções?
Não, não, eu prefiro um campeonato de quem é que almoça mais rápido (lavar a tupperware incluido).
Eu ganho, chefe, quantifique-me isso que eu excedo o cumprimento dos objectivos.
Queria continuar a fazer piadas acerca das competências pelas quais vou ser avaliada mas eu não me lembro de nenhuma.
Lembro-me que o chefe disse que gostavam de mim desde o princípio e que eu era um elemento valioso na equipa (vim a descobrir que ele disse isso a toda a gente, fiquei destroçada - mas porque é que me partem o coração assim?)
Mas sim, eu sou valiosa e por isso, para corresponder, chefe eu vou assinar por baixo deste texto que dita que, no ano de 2008, a funcionária madalena vai:
- beber uma garrafa de 1,5l de água de penalti sem deitar nenhuma gota fora
- almoçar, lavar a loiça e conviver com os colegas em apenas 9min
Em Janeiro nos encontraremos novamente, terminou ele, gostei muito deste bocadinho.
Não o vou desiludir chefe.
domingo, 13 de julho de 2008
Lutar por um beijo mais puro
Quando ele me confirmou que estava apaixonado por outra, eu fui à casa de banho, fechei a porta e pus os braços contra ela como se estivesse a assegurar-me que ninguém entrava.
Os acontecimentos que sucederam a esse momento na casa de banho, comigo a respirar fundo e a querer ser mulherzinha, foram muitos e rápidos mas resume-se a isto:
Vou-me afastar, disse-lhe eu a ele.
E pronto.
Acabou-se esta parvoíce de gastar boas musicas com esta história, que vergonha, que vergonha.
Apaguei as suas mensagens do meu telemovel, pus o seu sobrenome na lista de contactos, tirei-o da minha lista mental de coisas boas, lavei a cara e pensei: talvez fosse melhor arranjar um bocadinho de tempo para verter uma lagrimita.
Acho que o final de um flirt deve terminar com uma lagrimita e depois um sorriso e um sacudir de cabeça para espantar a tristeza.
Mas só hoje, ao dobrar a esquina para o portão do meu quintal, senti os olhos quentes.
As árvores do meu quintal, todas com os olhos postos em mim, meu deus como eu tinha vontade de estar com as minhas árvores, e elas, agitadas, faziam-me festas e diziam: ai miuda mas porque é que tu te esqueces de quem és?
E aí eu verti uma lagrimita.
Entretanto, eu fui a casa buscar os tais lençois de casal.
Pois bem, a minha mãe enganou-se.
Procurei-os em todo o lado...
Voltas e voltas e confirma-se: eu tenho é lençois de solteira.
Mas trouxe ervas e fruta e força e quando ia a sair do quintal eu voltei-me para as minhas amigas árvores e disse:
- De facto, ele era um idiota de merda.
quarta-feira, 9 de julho de 2008
All my friends will blame you, there's no telling what they'll do
É que eu reuni o meu concílio e foi unânime: o meu coração partiu-se.
I don’t really love you anymore – Magnetic Fields
E quando eles virem a minha cara quando eu falo de ti, a contar os pormenores que não têm interesse para mais ninguém a não ser para mim, aí é que vais ver o que é a força de uma comunidade.
Sweetheart come – Nick Cave
E se eles me vissem hoje a dizer-te, ao sol, “apetece-me tanto bater-te”, quando se via tão bem que eu só queria mesmo era tocar-te, vais pensar duas vezes da próxima vez que fizeres mal a uma rapariga com amigos.
If you’re looking for a way out – Tindersticks
Nem quero pensar quando me encontrarem e me perguntarem como eu estou e disser que estou bem mas depois começo a falar mais e pego no telemóvel e mostro mais uma mensagem e pergunto: estão a ver como é confuso, como às vezes parece mesmo que ele me está a flirtar? Pronto, será altura de ficares com medo de sair de casa.
Last night I dreamt that somebody loved me – The smiths
E os amigos que ainda não souberem da tragédia de tu gostares de outra, eu vou acabar por inserir o assunto numa conversa que nada tenha a ver com isso. E como vai a tese? (não tenho amigos verdadeiros que me perguntem isto mas está bem) e eu respondo: tu nem sabes o que se anda a passar comigo. Há um rapaz que não está apaixonado por mim…
Guess I’m doing fine – Beck
Eu vou contar a toda a gente, pelo menos a umas 5 ou 6 pessoas, como tu me partes o coração sempre que penso que não me queres conhecer no sentido bíblico. Por isso é melhor olhares sempre para os dois lados quando atravessas a rua.
Chaga – Ornatos Violeta
Foge, miúdo, foge desta cidade enquanto é tempo. Partiste-me o coração e eu reuni o concílio e decidimos que é legítimo matar-te, fazer com que te esvaias em sangue, ver-te agonizar como um mártir dos primeiros cristãos, perseguir-te sem que dês conta, arranjar esquemas para te humilhar publicamente, dar-te festinhas, convidar-te para vires comigo a Trás os montes, fazer-te um chá de erva príncipe, pegar em palitos e abrir-te os olhos e dizer-te: é comigo que devias ficar porque…
I’ve got a crush on you – Frank Sinatra
sábado, 5 de julho de 2008
A assustadora clarividência da minha mãe II
Diz que, por erro nosso, os de casal ficaram no armário e vieram os de solteira.
É só ir busca-los, foi só um mal entendido, uma distracção.
Encarei este episódio como um sinal dos céus.
Vou convidar alguém para dançar comigo amanhã.
A assustadora clarividência da minha mãe
quinta-feira, 3 de julho de 2008
terça-feira, 1 de julho de 2008
Decidir coisas é fixe
Passaram-se já muitos dias sem eu dar por mim a asneirar, bater, insultar ou sequer expressar o meu desejo por algum contacto físico.
Nada disso.
Não me ouviram a mim a dizer “vamos lá acabar com esta merda de flirt e vamos ao que interessa” nem me viram a mim a beliscar umas costas só porque me apeteceu.
Nada disso.
Nem sms convidativas, nem mails longos e lânguidos nem palavras descontroladamente fervorosas nem coisas como tu és mesmo giro nem tu deves beijar bem nem tu és meiguinho.
Nada disso.
Nem mamas nem pernocas nem ombros nem pés nem beijos de língua nem festas no cabelo nem calores na barriga nem ordinarices engraçadas nem cheiro de pele nem abraços longos nem apalpões nem arranhões nem cama nem lençóis nem sestas nem suores nocturnos nem nada, nem pensar, nem pensar!!
Nada disso.
Nem sequer conversas sobre irmos aqui ou ali ou fazermos isto ou aquilo sozinhos nem conversas sobre coisas que poderiam levar à questão inevitável:
- Mas afinal tu gostas de mim ou não?
Nada disso.
Decidi (sim, eu agora acho que posso decidir coisas, é uma nova situação na minha vida) que não é nada disso, nada disso, nada disso.
É outra coisa.
É aquilo.
domingo, 29 de junho de 2008
Um par para o baile
Chegou a hora do baile e eu queria ter um par para dançar.
De facto, convém escolher um namorado que não se importe de dançar quando é preciso.
A hora do baile nos casamentos é, para mim, muito importante.
É a que me deixa mais pensativa.
Porque a parte de atirar o bouquet já foi desmistificada, já perdeu seriedade, pronto, já não mete medo a ninguém.
Agora dançar no baile do casamento… isso sim, mete respeito. Não é para brincadeiras.
Os casais dançam juntos, as pessoas ficam de fora a observar, por fora parece que acham tudo normal mas eu sei que é através do modo como eles dançam que se vê se eles andam felizes um com o outro ou não.
Os mais atrevidos até poderão aproveitar essa ocasião para desenvolver algum engate iniciado ali no casamento ou ainda antes.
E ainda há uma questão muito importante para mim: é que se come muito nos casamentos e se uma pessoa dançar, sempre fica menos indisposta, ajuda a esmoer e a controlar a glicemia.
Mas eu… serei sempre a amiga/prima afastada/filha do primo/etc, com as roupas esquisitas (segundo dizem porque não é verdade) que é bem disposta e boa pessoa mas que, dado que é a Madalena, ninguém está à espera que apareça com um namorado que dance.
Um dia ainda os hei-de surpreender a todos eles, a todos os familiares e a todos os amigos da rede social da minha terra, e hei-de chegar à hora do baile com um rapaz pouco mais alto que eu, nem magro nem gordo, sem ter cabelo esquisito, vestido normalmente, já de casaco tirado (porque a essa hora já os homens andam todos de camisa), sem estar bêbado mas sem ser dos sóbrios ostensivos, um rapaz que já tenha travado conhecimento com os presentes, que já saibam o nome dele, e ele e eu vamos de mão dada, com ele à frente, até ao sítio onde se dança.
E depois começamos a dançar e ninguém olha como se fosse estranho.
Ninguém vai estranhar porque é só um casal jovem a dançar, parecendo ser felizes, ele a segurar com firmeza nela, dançam bem mas não bem demais, sabem o que estão a fazer, ela a deixar-se levar por ele, às vezes ele diz qualquer coisa e ela lança a cabeça para trás e ri, outras vezes metem-se com os restantes pares e geram simpatia sem forçar, e no final de duas ou três musicas, já cansados, ele, a brincar, fá-la girar, agarra-a contra ele e faz como nos musicais, ela dobra-se para trás, ele beija-a, riem-se com a brincadeira e regressam ao lugar deles, passando pela rapariga excêntrica que os estava a observar como se fosse tudo muito estranho.
quarta-feira, 25 de junho de 2008
BombAmor
APETECE-ME DIZER MUITAS ASNEIRAS QUANDO PENSO NISTO MAS NÃO O VOU FAZER
Pus uma bomba infusora de insulina paradigm 722 e apaixonei-me por ela, logo na primeira noite, quando era hora de dar a minha sexta injecção do dia e não tive que o fazer, porque tinha a minha querida bomba.
Eu amo a minha bombinha porque, mesmo habituada, afinal doia-me e eu já nem sabia que me doía. E isso é o pior que nos pode acontecer, nós já nem sabermos quando e quanto dói.
Aqui está ela, ligada por um tubo que está ligado a um reservatório de insulina que está ligado a um cateter que eu inseri no meu corpo e que então liga a bomba a mim.
Ando sempre com ela.
A bomba é boa companhia, eu às vezes falo com ela:
- Bombinha, eu sei que começámos um pouco mal por tu não seres colorida mas agora estamos unidas e sabes de coisas que mais ninguém sabe.
Já foste comigo a muitos sítios, vais a todos o lado onde vou. Mas também eu não sou assim muito viajada, não é?
Talvez, bombamor, este verão te leve a Marrocos. Que te parece, xuxu?
Às vezes vais numa coxa mas tu não gostas assim muito da coxa esquerda, pois não? Escorrega mais, não é fofinha?
Pois, deixa, eu ponho-te mais na direita que a mim também me dá mais jeito.
E, bombinha, gostas quando eu ponho o sensor que mede em permanência a minha glicémia através do liquido intersticial? Eu sei que gostas e eu até vou pôr um sensor dentro em breve mas, bombita, sabes que as empresas de dispositivos médicos não podem andar assim a dar sensores, essas coisas são caras...
E eu sei, bomba, que tu tens que ser forte quando as pessoas olham para ti com aquele ar de quem está a conhecer uma versão ultrafeminina do robocop...
Eu sei, meu doce, que não é fácil, bem ouço os teus suspiros de impaciência.
Mas repara, quando vês uma pessoa na rua com uma garrafa de oxigénio também olhas assim com um misto de horror e pena (e eu sei que tu não te dás nada bem com bolhas de ar, desculpa estar a ser tão directa, mas não dás mesmo).
Toma mais um beijinho nesses botõezinhos tão resistentes, minha lindeza, eu sei que te levei à praia e que tu, minha marota, ias fazendo com que as cuecas do meu biquini caissem com o teu peso.
Mas eu prometo que te vou arranjar uma bolsinha para te proteger do calor e para não andares desnuda no meio da areia
Pronto, agora vamos dar um bolus para comer o iogurte, estou orgulhosa de ti, bombamor, porque me aguentaste neste dia quando só me apetecia saber o que dizer e não sabia.
Parece-me, amor de bomba, que eu colho o que semeio e que tenho que começar a semear coisas boas.
Mas, sobretudo, coisa boa da minha vida, que eu percebo muito pouco de hortaliça...
Ai que querida, a bomba está a dizer-me que gosta de mim mas preferia que eu fosse cor de laranja...
terça-feira, 24 de junho de 2008
Acho que o jantar correu bem mas
O stripper Claudio despertou em mim sentimentos maternais ou a primeira conversa a sério sobre a bomba
Como estava eu a dizer, nessa noite, finalmente alguém me fez uma pergunta inteligente sobre a a bomba (de insulina).
Eu levava umas calças (as unicas que tinha em casa que já não é a minha casa mas que continua a ser A casa) e então via-se o cateter.
Formou-se o grupinho habitual em meu redor: ah, e o que é? e tens há quanto tempo? o que é isso? e dói? e como fazes para comer? e já não tens que te picar? e tens que andar sempre com isso?
Eu lá ia explicando, bla bla bla, e uma amiga minha, que estava calada durante o meu discurso só me disse, muito preocupada:
-Mas como é que fazes quando estás na cama com o teu namorado?
Abracei-a.
- Tiro a bomba, ponho a capsula e espero que corra tudo bem. Mas desde que pus a bomda ainda não foi preciso...
- Olha, isso é que é pior! - disse ela.
quinta-feira, 19 de junho de 2008
A Alemanha não perdeu 3-0?
Este Europeu foi semelhante a um desgosto amoroso onde não houve grande empenho.
É tão parecido que até criei um blog.
Para falar desse desgosto, desse affair onde me empenhei tão pouco.
Como o Ricardo na defesa.
Assim estou aqui a ouvir Magnetic Fields (meu deus, magnetic fields após perder com a Alemanha!), a curtir o desgosto da perda.
Afastei-me do mundo, pus aquela cara, o casaco de andar por casa, isto é mesmo um desgosto amoroso, isto é mesmo um jogo onde tu jogas bem, bem bonito mas tens falhas onde não podes falhar.
Estamos a perder 3-1 e eu penso: se eu preciso de chorar, agora é uma boa altura.
Em vez disso, trabalhei um bocado, sem grande stress.
É uma prova, não é? em como eu não estava assim tão empenhada com a selecção.
Ah mas a prova maior foi que, mal o jogo acabou, eu abri a janela e olhei para a rua e pensei: pah, como é que ficará esta rua quando o Benfica ganhar o campeonato?
Mal acabei de sofrer com um, penso logo no seguinte...
E continuam as semelhanças com os desgostos amorosos.
Também não vou mandar sms charmosas (as minhas sms charmosas sou eu a dizer coisas que me parecem engraçadas e que não incluem asneiras por termos perdido nem nada disso, coisas sérias, que demonstram como consigo ser espirituosa sem asneirar).
Não vou não.
Portanto, isto é um desgosto amoroso.
Se eu estou a ponderar sms e pesar prós e contras, é um affair por resolver.
Mas se eu estou a pensar no Benfica mal acabou a selecção, não havia assim tanto empenho.
Pior, isso se calhar está em toda a minha vida: falta de empenho.
É isso mesmo, eu não estou empenhada em ser fixe.
Reparem, as minhas sandálias fazem com que a unha do dedo grande do meu pé esquerdo fique negra.
Esta foto demonstra desde logo o meu gosto extraordinário para escolher papel de parede, e mostra depois como os meus pés são feios e como eu, ao publicar esta foto, estou a arriscar poder deixar de me preocupar com empenho e charme devido ao asco que estou a causar em muita gente.
E eu não tenho paciência para cortar as unhas dos pés.
Deixo sempre chega-las até ao exagero do comprimento.
Mas porque raio só essa unha é que fica suja?
(Eu sei, as outras não estão muito melhores - quando eu tiver uma máquina fotográfica boa, eu tiro para se ver bem como aquela fica muito mais negra que a outra).
E se eu estivesse empenhada estaria a pensar numa sms bem inteligente para enviar mas, ao invés, estou a pensar nas borbulhas que tenho que parecem mesmo picadas.
Mas será que eu trouxe pulgas para a minha nova casa?
Mas se eu estava a pensar nisso porque me fui lembrar do contacto via telemóvel?
A Alemanha por acaso não perdeu 3-0 e acabou com o meu sofrimento, pois não?